A penúltima semana antes das eleições não começou bem para o presidenciável Ciro Gomes (PDT). A candidatura pedetista dá sinais de crise depois da pesquisa BTG/FSB apontar sua desidratação para o voto útil, em especial no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista anunciou mais apoios do campo do centro, como o do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles (MDB), e a defecção de mais pedetistas, que declaram o voto no postulante do PT.
O levantamento BTG/FSB aponta Lula na frente, com 44% das intenções de voto; Jair Bolsonaro (PL) com 35%; Ciro Gomes com 7%; e Simone Tebet (MDB) com 5%. Na pesquisa anterior, o pedetista tinha 9%. No total, a chamada terceira via — soma dos candidatos Ciro, Tebet e Soraya Tronicke (União Brasil) — perde cinco pontos percentuais, enquanto Lula avança três, e Bolsonaro segue estável.
No levantamento do Ipec, também divulgado ontem, Lula cresceu 1 ponto percentual, e Ciro, que pontuava com 7% das intenções, se manteve estável. O mesmo aconteceu como Bolsonaro, que manteve o patamar de 35%.
Ciro criticou os apoios de ex-presidenciáveis ao petista, em uma entrevista ao SBT, ontem à noite. “Lula fez uma reunião em que estavam a turma da ultraesquerda, a galera do PSol, junto com Henrique Meirelles. Desse mato aí, não sai cachorro. Isso é um total conchavo do ponto de vista do modelo econômico”, disparou.
Além de lutar contra o voto útil, Ciro enfrenta a perda de apoios dentro do seu partido e corre o risco de sair da campanha com um capital político menor do que tinha. Sem formar alianças partidárias (leia na reportagem abaixo) e com uma estratégia de campanha que destruiu muitas pontes com o campo da centro-esquerda, o candidato acusou o isolamento. “Meu projeto é centro-esquerda, mas esse termo de esquerda foi roubado pelo PT, por isso me afastei para nunca mais chegar perto dessa gente”, acrescentou, na entrevista.
Na semana passada, um manifesto de pedetistas, intitulado “Trabalhistas pela democracia”, fez diversas críticas ao estilo do candidato, como “seu vocabulário chulo nos vídeos e redes sociais” e declarou aval a Lula.
Ontem, outro dirigente nacional do partido, o ex-deputado estadual do Paraná Haroldo Ferreira, apresentou uma carta de afastamento da direção com fortes críticas a Ciro e ao marqueteiro João Santana, a quem responsabiliza pela “campanha odiosa contra o principal candidato de oposição ao regime bolsonarista”, referindo-se a Lula. “É lamentável que Ciro Gomes tenha adotado uma estratégia errática de tentativa de desconstrução da imagem de Lula, ao invés de focar no Programa Nacional de Desenvolvimento”, reprovou o dirigente partidário.
João Santana é o mesmo marqueteiro responsável pela campanha de reeleição de Dilma Rousseff (PT), que, à época, foi muito criticada pelos ataques que fez à então presidenciável Marina Silva (Rede). Agora, é apontado como um dos principais responsáveis pelo tom violento da campanha de Ciro contra o ex-aliado Lula.
O presidente do PDT, Carlos Lupi, tenta rebater a tese do voto útil. Disse, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, que o “voto útil só serve aos inúteis” e questiona: “Se a pesquisa diz quem vai ganhar, para que votar?”.
Para o sociólogo e diretor do Instituto Opinião, Arilton Freres, só será possível saber se o voto útil vai mesmo se concretizar na última semana antes das eleições. Ele considera que, mesmo com oscilações, Ciro tem mantido uma margem resiliente nas pesquisas. O especialista pondera que um dos movimentos possíveis para o voto útil é o cansaço do eleitor. Segundo ele, “a campanha eleitoral nunca acabou”. “Desde 2018, ela está na rua. Prova disso é que o número de indecisos é muito pequeno, inclusive, no voto espontâneo”, destaca.
Glauco Peres da Silva, economista e professor do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP), sustenta que não há polarização no Brasil e, sim, uma antecipação do segundo turno. “A eleição do Brasil vai ter dois candidatos, e um terceiro correndo por fora. Com dois presidentes na disputa, é obvio que eles vão ser o foco”, argumenta. Para Silva, a tendência do voto útil deve se acentuar e reduzir o eleitorado tanto de Ciro Gomes como de Simone Tebet.
Percalços em série
Desde a pré-campanha, Ciro Gomes tem enfrentado dificuldades para atrair aliados. Fez várias tentativas para alargar a base de apoio a sua candidatura, todas infrutíferas. No início do ano, o candidato do PDT chegou a sonhar com Marina Silva (Rede) como sua vice-presidente, mas a própria ex-senadora impediu que a conversa avançasse.
Em abril, Ciro admitiu tratativas com o União Brasil, de Luciano Bivar, depois que o partido vetou a candidatura do ex-juiz Sergio Moro à Presidência. Em um evento em Brasília, ele revelou que participou de um jantar com Luciano Bivar e ACM Neto (atual candidato do UB ao governo da Bahia). “Eles perguntaram se eu admitia entrar numa dinâmica de conversa com essas outras pessoas, e eu disse a eles que, a mim, repugnava a ideia de sentar com um inimigo da República como Sergio Moro. Parece que essa questão está vencida, e a única restrição que eu fazia está superada, aparentemente”, declarou o pedetista, à época.
Investida
Também foi tentada uma aproximação com o PSD de Gilberto Kassab, sem sucesso. O próprio Kassab, apesar de se declarar admirador de Ciro, fez ressalvas a uma aliança formal com o pedetista. Disse que, se o ex-governador ultrapassasse 10% ou 15% nas pesquisas, poderia viabilizar apoios de outros partidos. E a conversa ficou por aí.
Como nenhuma negociação avançava, Ciro e a direção do PDT começaram a procurar dentro do próprio partido o nome de uma mulher — exigência do candidato — para a vaga de vice. Tentaram atrair a senadora Leila Barros, que preferiu lançar-se ao governo do DF. Entre os outros nomes cotados — a ex-reitora da Universidade de São Paulo Suely Vilela, e as vice-prefeitas de Salvador, Ana Paula Matos, e de Recife, Isabella Roldão —, a escolhida foi Ana Paula Matos.
CB