A campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deu ontem mais uma cartada em busca do voto útil para tentar a vitória no primeiro turno das eleições. Em um hotel de São Paulo, o petista reuniu oito ex-presidenciáveis para uma declaração conjunta de apoio, incluindo dissidentes do PT e adversários históricos. Nos discursos, as divergências foram pinceladas, mas o ponto comum foi a defesa da democracia, que, na avaliação do grupo, está ameaçada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição.
Além do vice na chapa de Lula, o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB), sentaram-se à mesa Fernando Haddad (PT), Marina Silva (Rede), Luciana Genro (PSol), Henrique Meirelles (União Brasil), Cristovam Buarque (Cidadania), Guilherme Boulos (Psol) e João Goulart Filho (PCdoB). A reunião foi organizada pelo coordenador do programa de governo, Aloizio Mercadante.
“O que vocês estão fazendo no gesto de hoje (ontem), companheiros, é assumindo um compromisso. E não é um compromisso com o Lula. O que vocês estão fazendo é assumir o compromisso de que este país vai voltar a viver democraticamente”, disse Lula. “Não é o presidente da República e sua assessoria que determina o que é bom para a sociedade. A sociedade tem de determinar, e o governo tem de abrir espaço e criar canais de participação.”
O ex-presidente enfatizou ser o alvo preferencial dos adversários na corrida eleitoral. “Cada gesto meu é na perspectiva de mostrar para a sociedade que eu quero ganhar. Obviamente que é uma eleição atípica, porque todos os candidatos, desde o atual presidente até os outros estão numa briga mais forte contra mim do que contra o próprio presidente, porque eles não querem que eu ganhe no primeiro turno”, lamentou.
Um dos apoios improváveis entre os ex-presidenciáveis foi o de Henrique Meirelles, que presidiu o Banco Central durante todo o governo de Lula e foi ministro da Fazenda na gestão Michel Temer. Afastado atualmente da política, Meirelles é crítico de medidas previstas no programa de governo do petista, especialmente a revogação do teto de gastos e da reforma trabalhista.
Ainda assim, o ex-ministro citou indicadores econômicos favoráveis dos oito anos do governo Lula, como a criação de mais de 10 milhões de empregos e crescimento médio do Produto Interno Bruto (PIB) de 4%. “Esse é um resumo dos fatos. Isso é, na minha opinião, o que interessa: emprego, renda, padrão de vida da população e mostrar quem faz. Essa história de falatório pode impressionar muita gente, mas eu acredito em fatos. Olho e vejo o resultado do seu governo”, afirmou Meirelles, presidenciável pelo MDB em 2018.
Ele também citou que o aumento dos auxílios, promovido por Bolsonaro às vésperas da eleição, vai causar um problema no futuro, mas que pode ser resolvido.
Reconciliação
Marina Silva e Cristovam Buarque, por sua vez, foram alvo de hostilidades do PT no passado recente. A ex-senadora ocupava o Ministério do Meio Ambiente no governo petista, mas deixou a pasta em 2008, após ser escanteada e ter que ceder em sua política de preservação. O ressentimento cresceu em 2014, por ter sido fortemente atacada pela campanha de Dilma Rousseff, que buscava a reeleição. Na semana passada, porém, Marina declarou apoio a Lula citando um “reencontro político e programático”.
“Essa reconciliação do Brasil consigo mesmo, hoje o senhor é o que reúne as melhores condições para nos ajudar a realizar”, afirmou Marina no encontro de ontem, dirigindo-se a Lula. “Existem momentos na história em que a gente percebe que há algo muito forte em jogo, que é a banalização do mal”, acrescentou.
Já Cristovam Buarque ocupava o Ministério da Educação, no primeiro governo Lula, quando foi demitido por telefone. À época, o episódio causou mal-estar entre aliados. O ex-senador passou a ser crítico do petista e disputou as eleições presidenciais de 2006 pelo PDT.
“Será uma tragédia termos um segundo turno. Eu não tenho dúvida de que ele (Lula) ganhará no segundo turno, se houver. Mas serão quatro semanas imprevisíveis do ponto de vista de violência nas ruas, de fake news para todos os lados”, destacou Buarque. Segundo ele, o ex-presidente é o “melhor que nós temos hoje”.
Divergências
Outros ex-presidenciáveis que estavam na reunião já haviam declarado apoio a Lula, como Boulos e Luciana Genro, cujo partido, o PSol, compõe a chapa do petista. Os dois, porém, têm divergências em relação ao ex-presidente. A legenda, inclusive, foi fundada por Luciana Genro após a saída dela do PT, em 2003.
“Todos conhecem nossas diferenças, elas são públicas, mas estamos aqui hoje (ontem) para dizer que essas diferenças são menores neste momento histórico do que aquilo que nos une para preservar a democracia brasileira”, discursou Boulos, candidato à Presidência em 2018. “Essa união expressa um entendimento conjunto de que a eleição do presidente Lula é essencial para a democracia brasileira, para derrotar um fascista, alguém que ameaça as instituições e as liberdades.”
Luciana Genro afirmou que a união é uma “frente antifascista”. Ela definiu o projeto de governo de Bolsonaro como “racista, misógino, LGBTfóbico, que quer eliminar os seus adversários”.
Candidato à Presidência em 2018, João Goulart Filho destacou a necessidade de união. “Neste momento, todos aqueles que lutaram pela democracia, que tombaram no caminho da restauração democrática, todos que tiveram presentes nas reivindicações junto ao povo brasileiro estão apoiando a candidatura de Lula”, ressaltou.
Já Alckmin disse ver na população um entendimento maior sobre a importância das eleições deste ano. “Todos nós aqui fomos candidatos a presidente da República. Tínhamos projetos diferentes para o Brasil, mas sempre tivemos algo em comum que é a pedra basilar, o princípio, que é o respeito à democracia e o respeito ao povo brasileiro”, frisou.
CB