O ex-coordenador-geral do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e o irmão dele, ambos médicos, se tornaram réus pelo suposto desvio de recursos do Fundo Municipal de Saúde de Itumbiara. Auditoria revelou que o ex-coordenador Rogério Cardoso Guimarães preparou escalas de trabalho fraudulentas para que ambos recebessem do município sem executar suas funções.
Somente em fevereiro de 2022, Rogério teria cumprido 55 plantões de 12 horas. Soma corresponde a 27,5 dias ininterruptos de trabalho, em um mês que teve apenas 28 dias. Segundo o MP, irmão dele, Renato Cardoso Guimarães, também era beneficiado pelo esquema sem a devida prestação de serviços à comunidade.
Total dos danos aos cofres públicos ainda é calculado. Ambos respondem por improbidade administrativa, bem como por supostamente promover e facilitar enriquecimento ilícito. O ex-gestor, Rogério, ainda acumula acusação por negar publicidade a atos oficiais.
“Escalas fictícias”
De acordo com o Ministério Público, as irregularidades eram cometidas por meio da gestão e execução de plantões médicos no Hospital Modesto de Carvalho (HMMC) e no Samu. Os acusados teriam realizado direcionamento de trabalho a determinados profissionais em detrimento de outros credenciados, os quais teriam interesse e disponibilidade na prestação de serviço na rede pública.
A promotora de Justiça Ana Paula Sousa Fernandes, autora da ação, aponta que a dupla se beneficiava com escalas de trabalho fictícias, as quais eram montadas com número de profissionais superior àquele que efetivamente cobria os plantões nas unidades.
Apurou-se então que Rogério, responsável técnico pelo Samu, era o encarregado exclusivo pela elaboração das escalas dos médicos socorristas e sempre direcionava para si, segundo o MP, um número expressivo de plantões. O gestor ainda incluía seu irmão, Renato, no planejamento supostamente irregular, sem que ele prestasse serviço de saúde na unidade apontada.
Réus negam irregularidades
Rogério Cardoso negou ao MP que tivesse elaborado escalas fraudulentas, porém, admitiu o não comparecimento do irmão, Renato, ao Samu. O argumento foi de que ele teria sido substituído por outro profissional nos dias em que seu nome aparecia na previsão de trabalho.
Porém, registros de chamadas recebidas pela Central de Regulação do Samu, mapas de atendimentos diários e registros do Livro de Enfermagem, bem como depoimentos de profissionais do serviço de urgência não endossaram a argumentação dos réus.
27 dias sem descanso
Auditoria realizada no Fundo Municipal de Saúde apontou que Rogério Cardoso teria cumprido 55 plantões de 12 horas somente em fevereiro de 2022, 30 deles no Pronto Atendimento do HMMC e outros 25 no Samu. Total corresponderia a 27,5 dias de trabalho, sem período de descanso entre plantões em um mês que teve apenas 28 dias. De acordo com a promotora, a escala era “humanamente impossível de se cumprir”.
Segundo afirma a promotora, “lamentavelmente, na prática, o que se observa com relativa frequência são que as lacunas na escala são provocadas porque, na maior parte das vezes, as unidades assistenciais permitem que profissionais da saúde, especialmente médicos, cumpram suas jornadas de trabalho de forma concentrada nos dias da semana que lhes convêm e de forma ininterrupta, beneficiando-os a fim de permitir que alguns concentrem um número de plantões totalmente desproporcional àquele distribuído aos demais, garantindo-lhes rendimentos que destoam de outros profissionais médicos credenciados”, completa Ana Paula Sousa.
Devolução
Levantamentos do MP constataram que Renato Cardoso recebeu R$ 35.148,48, decorrente de plantões do Samu, no período de agosto de 2021 a janeiro de 2022, sem que tivesse comparecimento uma única vez na citada unidade de saúde.
O órgão, porém, não conseguiu contabilizar o valor total do dano causado por Rogério Cardoso, que encaminhava, para fins de pagamento, escalas médicas contendo sempre o nome de dois médicos, quando muitas vezes a unidade foi servida por apenas um profissional durante o plantão, em desacordo com as normativas do Ministério da Saúde.
Desse modo, a ação pede a indisponibilidade de bens de Renato e Rogério no valor de R$ 35.148,48, referente ao valor do dano até o momento apurado. O MP, porém, demanda a condenação de Rogério ao pagamento de indenização de R$ 500 mil, a título de dano moral coletivo, valor a ser depositado em conta específica do Fundo Municipal de Saúde.
Ação contra o município
O órgão ainda iniciou ação contra a Prefeitura de Itumbiara para que a cidade adote medidas administrativas para assegurar o cumprimento das cargas horárias dos médicos plantonistas que prestam serviços no Hospital Municipal Modesto de Carvalho, no Samu e na UPA 24 Horas Dr. Ciro Garcia.
O MP ainda requer a implantação do prontuário eletrônico na rede pública de saúde, através de software específico, de acordo com a Resolução nº 1.821/2007 do Conselho Federal de Medicina (CFM), a Lei do Prontuário Médico (Lei nº 13.787/2018) e o Código de Ética Médica (artigo 87), com certificação digital do profissional responsável pelo atendimento, e uma distribuição mais justa dos plantões entre todos os credenciados com disponibilidade e interesse na prestação de serviço, sem favoritismos.
Nota
A Prefeitura de Itumbiara se manifestou por meio de nota. Veja a íntegra:
“A Prefeitura de Itumbiara informa que colabora, desde o início, com as investigações realizadas pelo Ministério Público. O médico Rogério Cardoso Guimarães foi destituído das funções de responsável técnico do SAMU em 12/04/2022.
Rogério Cardoso e seu irmão, Renato Cardoso Guimarães, prestam serviços como médicos credenciados para o Fundo Municipal de Saúde e a Prefeitura informa que foram abertos dois Processos Administrativos de Fornecedores (PAFs), para apuração dos fatos”.
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