Especialistas do setor de energia elétrica apelam para que os senadores incluam um regime específico para o segmento dentro da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 45/2019 da Reforma Tributária. No texto aprovado pela Câmara dos Deputados, não há menção às características primordiais apontadas pelo setor elétrico: a essencialidade da energia — já declarada pela Constituição — em todas as suas etapas (geração, transmissão, distribuição e comercialização) e a complexidade fiscal. A mudança é necessária porque, além de a energia elétrica ser um bem essencial para o crescimento econômico do país, a redução das contas de luz traz um impacto positivo para o Produto Interno Bruto (PIB) e para a população. O setor busca evitar também a incidência de imposto adicional seletivo sobre as contas de luz, já que os grandes prejudicados seriam os consumidores.
Estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) afirma que, a cada 10% de redução na conta de luz, é possível gerar um rebatimento positivo no PIB de 0,45% ao ano. O recurso vira investimento, e o dinheiro economizado em energia gera riqueza ao governo, além de promover o desenvolvimento e a geração de empregos. A Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) defende que a reforma tributária dê um sinal concreto de prosperidade ao país tratando a energia elétrica como vetor de desenvolvimento da sociedade.
De acordo com o diretor Institucional e Jurídico da Abradee, Wagner Ferreira, “a energia mais barata favorece o ambiente econômico, aumenta a atividade industrial e a capacidade competitiva”. É o chamado “círculo virtuoso” na economia, quando se reduz a tributação, melhora o preço final do produto, gera menor inflação e aumenta o poder de compra.
“A energia mais barata melhora a vida das pessoas, o ambiente econômico e aumenta a nossa competitividade industrial”
Wagner Ferreira
Diretor da Abradee
“O modelo tributário específico, com o desenvolvimento de leis complementares e a longa transição a ser implementada, permite, por exemplo, que possamos compreender e estabelecer a melhor forma de dar o tratamento tributário adequado à energia elétrica. A partir da transição e das leis complementares que virão, o país pode construir uma alíquota reduzida em relação à alíquota-padrão”, afirma Ferreira.
O setor de energia tem uma relação direta com a transição energética, neoindustrialização, novas soluções e negócios para o Brasil, e aproveitar essa janela de oportunidade exigirá competitividade, sinal econômico correto. Tudo está ligado a energia. Por isso, o principal desafio do setor elétrico é a tarifa. “Sem um preço justo, não há modernização do parque de ativos e atualização do sistema elétrico e do serviço”, afirma o presidente do Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase), Mário Menel. Para ele, a reforma tributária trará uma simplificação para diversas questões relacionadas à energia elétrica.
“Sem uma tarifa justa, não há modernização do parque de ativos e atualização do sistema elétrico e do serviço”
Mário Menel
Presidente da Fase
“Defendemos o reconhecimento da energia elétrica como bem essencial, porque é fundamental, e ela está na base de todos os produtos. Dessa forma, reconhecendo a essencialidade, elimina-se a possibilidade de jogar o setor dentro de um imposto seletivo. Assim como é necessário um regime específico devido à sua alta complexidade fiscal. A reforma trazendo uma simplificação em relação ao atual sistema tributário já será um ganho grande, mas para que isso se concretize é preciso organizar as complexidades fiscais numa lei complementar”, diz.
Prejuízo maior recairá sobre os mais pobres
Para o presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, Luiz Eduardo Barata, sem a redução de tributos e encargos na conta de luz, as famílias de menor poder aquisitivo serão as mais prejudicadas. É exatamente por isso que hoje o cidadão que tem tarifa social (consumo de até 100Kw) tem um tratamento fiscal que desonera ou isenta a sua tributação no consumo, ou seja, não paga o ICMS (ou paga alíquotas menores). Estados podem passar a cobrar alíquota de até 28% aos consumidores se a PEC 45/2019 não for modificada.
Segundo Wagner Ferreira, mais de 16 milhões de lares têm a tarifa social. “Hoje 50 milhões de brasileiros são atendidos com uma tarifa social e têm uma tributação isenta ou reduzida, dependendo do perfil de consumo e dos decretos estaduais. Na prática, sem um tratamento pelo Senado da PEC, esses consumidores terão um aumento de tributação real. Esse é um fato que preocupa e merece absoluta atenção. Não podemos permitir um regime em que a arrecadação penaliza os mais pobres, ampliando desigualdades.”
Em média, 23% da tarifa da conta de luz é relativa a custos de distribuição de energia; 25%, geração; 7% são custos com a transmissão de energia; e 45% são tributos federal e estadual e encargos setoriais. O maior valor são os tributos. Se tirá-los da cobrança, a conta de luz poderia ser reduzida em até 45%. Hoje, 30% do que os consumidores de energia pagam são destinados aos tributos.
“É exatamente por essa essencialidade e complexidade fiscal que existe a necessidade de um tratamento específico em lei complementar. É necessário que se aprimore o conceito do imposto seletivo para que não haja possibilidade de imposto adicional sobre as contas de luz, o que compromete o desenvolvimento do país e o orçamento das famílias”, avalia Ferreira.
“Quando se reduz a conta de energia, aumenta o consumo em praticamente tudo”
Luiz Eduardo Barata
Presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia
Luiz Barata observa que, quando se reduz a conta de energia, se aumenta o consumo em praticamente tudo, porque aumenta o poder de compra das pessoas, e elas podem consumir mais, o que gera um impacto positivo em toda a economia. “O peso do custo da energia nos produtos e serviços é enorme e afeta toda a população”, diz.
O Globo/Abradee