Baixa à sepultura, nesta manhã, no cemitério Primaveras 1, em Guarulhos, na Grande São Paulo, o corpo de PC Siqueira, influenciador digital de 37 anos, o primeiro youtuber brasileiro. Ele se matou em seu apartamento na zona sul da capital paulista, depois de ingerir álcool, substâncias entorpecentes e medicamentos.
Sofria de depressão e se tratava da doença. Em junho de 2020, Siqueira fora alvo de uma postagem no Twitter na qual aparecia num suposto chat em que supostamente compartilhava fotos íntimas de uma menina de 6 anos. A Polícia Civil de São Paulo abriu inquérito e apreendeu equipamentos eletrônicos na casa dele.
Em fevereiro de 2021, a Polícia Técnica divulgou o resultado da perícia nos computadores, celular e aparelhos de videogame de PC Siqueira. O laudo não encontrou nenhum registro que fosse capaz de incriminá-lo. Mesmo assim, sua carreira como influenciador digital, que já estava em declínio, sofreu um forte e definitivo abalo.
A perícia concluiu: “PC Siqueira não armazenava ou compartilhava fotos ou vídeos de conteúdo pornográfico de menores de idade, não teve conversas com outras pessoas sobre o tema e tampouco fez buscas em sites de pesquisas a respeito do assunto”. Àquela altura, porém, o estrago estava feito. A internet é cruel e não perdoa. Siqueira não suportou.
Jéssica Vitória Canedo, 22 anos de idade, também não suportou o efeito deletério de ver seu nome exposto no perfil de entretenimento Choquei. Diálogos criados por inteligência artificial simularam uma conversa íntima dela com o humorista Whindersson Nunes. Era tudo falso. A mãe de Jéssica pediu a retirada do conteúdo, Nunes, idem.
O conteúdo só foi retirado depois que Jéssica se matou. Ontem, o Choquei lavou as mãos por meio de nota oficial na qual diz que “passa por um profundo processo de reavaliação interna dos métodos adotados visando a implementação de filtros e códigos de conduta para evitar que episódios dessa natureza voltem a acontecer”.
“A gente nunca produz conteúdo”, desculpou-se Raphael Sousa, administrador do perfil Choquei, que acumula mais de 20 milhões de seguidores nas diversas redes. “O que a gente posta é conteúdo replicado. Isso aí é papel de jornalista.” Quer dizer: confirmar se a informação que divulga está correta não é problema dele, mas dos outros.
PC Siqueira foi cancelado por milhares de seguidores; Jéssica, que também sofria de depressão, teve sua imagem vilipendiada nas redes sociais. Quem pagará pela morte dos dois? Quem ganhou e continuará a ganhar com casos como esses? O linchamento digital rende likes e engajamento. Com isso ganham as plataformas que o incentivam.
Observa Pedro Doria, jornalista especializado no assunto:
“As redes não são um jogo. Mobilizam a vida de pessoas e afetam o destino de sociedades. Todo influenciador com grande alcance precisa compreender que uma audiência grande impõe responsabilidade. Traz dinheiro, mas impõe obrigações éticas perante a comunidade. […] Bolsonaro passou, e paramos de discutir os efeitos dos algoritmos. A nova geração de inteligência artificial vai turbiná-los. O problema não acabou e ficará pior.”
Metrópoles