Governadores e prefeitos começam a desembarcar, hoje, em Brasília, para pressionar deputados por mudanças no texto da reforma tributária. Apesar das muitas divergências em relação ao projeto — que pode não ser aprovado nesta semana, apesar de o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ter afirmado que quer liquidar o assunto nas próximas horas —, há ao menos um consenso: como está sendo construído, várias unidades da Federação e prefeituras asseguram que sairão perdendo ainda mais arrecadação.
Sete governadores vão participar do encontro do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud) para pressionar deputados dos seus estados por mudanças no texto do relator, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Estão previstas as presenças dos governadores Cláudio Castro (RJ), Eduardo Leite (RS), Romeu Zema (MG) e Tarcísio de Freitas (SP) — entre outros.
O governador paulista lidera o grupo que se opõe à criação do Conselho Federativo, colegiado que vai gerir o futuro Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) — substituto do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e do Imposto sobre Serviços (ISS). Os estados temem perder autonomia na gestão dos recursos com o IBS.
No domingo, Tarcísio se reuniu com cerca de 30 deputados federais paulistas para debater pontos da reforma. Segundo o presidente do MDB, Baleia Rossi (SP), que participou do encontro, o governador apoia 90% do texto, mas interlocutores afirmam que fará uma contraproposta com mudanças em, ao menos, oito áreas. Entre elas, no modelo de arrecadação, na governança do Conselho Federativo e no Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais.
“Acho que todo mundo já conhece quais são os pontos de São Paulo. As divergências são poucas e são ajustáveis, para que a gente possa preservar o federalismo”, explicou Tarcísio.
O que parte dos membros dos Cosud defende é que o Conselho Federativo tenha uma representação proporcional à população de cada ente da Federação, com o objetivo de “evitar distorções na tomada de decisões”. Existe a preocupação de que outros estados acabem dependendo de São Paulo caso o critério seja seguido.
Prejuízos
Crítico da reforma, o governador Ronaldo Caiado (GO) se encontrará com a bancada goiana na Câmara e com lideranças partidárias e de frentes na Casa. Ele considera que o texto favorece apenas as grandes indústrias.
“Do jeito que está, não atende aos interesses dos entes federados e, muito menos, aos estados em desenvolvimento, como Goiás”, afirmou.
Já a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) convocou um protesto na Câmara a partir das 17h. Busca uma alternativa para que os municípios não percam a autonomia de arrecadação. Entre as presenças confirmadas estão os prefeitos de São Paulo, Ricardo Nunes; do Rio de Janeiro, Eduardo Paes; e de Belo Horizonte, Fuad Noman.
Prefeitos de capitais e grandes cidades, onde se concentram a maior arrecadação do ISS, alegam que a proposta prejudicará os municípios por retirar a autonomia das cidades para arrecadarem.
Setor produtivo ecoa desgosto
A insatisfação do setor produtivo reforçará o coro de críticas à reforma tributária em Brasília, nesta semana. Embora a maioria seja favorável à simplificação do sistema, confederações estimam perdas com o texto elaborado e líderes dos segmentos têm marcado presença no Congresso na tentativa de negociar concessões com os deputados.
O texto preliminar prevê a substituição de cinco tributos por dois mais amplos, com regras válidas nacionalmente. A redação projeta fixar uma alíquota padrão do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que deve girar em torno de 25%. Haverá, ainda, alíquotas reduzidas para setores específicos, a exemplo de medicamentos, serviços de saúde, serviços de educação, transporte público coletivo e artigos da cesta básica. Demais setores tentam entrar no grupo de beneficiados.
Segundo estudo da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), a reforma proposta no substitutivo pode trazer aumento de carga tributária acima de 170% para atividades da área. “A reforma tributária é essencial ao desenvolvimento econômico do país, mas não pode punir o setor, que é o que mais avança e foi o primeiro a ajudar os brasileiros”, defendeu o presidente da CNC, José Roberto Tadros, ao lembrar que os serviços têm um peso de cerca de 70% no Produto Interno Bruto (PIB).
Desconfianças
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP), que reúne os segmentos de comércio de bens, serviços e turismo no estado de São Paulo, considera que a redução de alíquota de 50% para algumas atividades — como educação e saúde — não alivia o aumento da carga de tributária. Segundo a entidade, que teme que os pequenos serviços sejam os mais prejudicados, a solução não é suficiente para minorar os efeitos nocivos da reforma no setor.
A produção rural foi uma das contempladas pelo tratamento diferenciado, com alíquotas menores do que a taxação padrão. Ainda assim, o agronegócio permanece com dúvidas sobre as mudanças. Atualmente, conta com muitos benefícios tributários, como na aquisição de insumos, vendas com redução de alíquota e crédito facilitado. Ao considerar uma alíquota fixa do IVA, o agronegócio alega que o percentual irá onerar a cadeia de produção, ameaçando, inclusive, uma alta no preço dos alimentos.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi questionado se poderiam ser feitas novas concessões para garantir vantagens ao setor produtivo. Ele afirmou que isso não deve acontecer e considerou que as críticas das confederações e federações como “normais” em “reta final de uma negociação complexa”.
Correio Braziliense