Novos áudios: a ira de Pedro Guimarães por ter perdido mais de R$ 100 mil por mês

O então presidente da Caixa xinga e esbraveja com subordinados por terem deixado passar uma decisão que limitou seus jetons

GOVERNO FEDERAL, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, ASSÉDIO SEXUAL, ASSÉDIO MORAL, PEDRO GUIMARÃES
Foto: Igo Estrela

Na semana passada, a coluna revelou depoimentos e áudios que expuseram os acessos de fúria de Pedro Guimarães, agora ex-presidente da Caixa Econômica Federal, em reuniões com funcionários do banco.

Junto com as gravações, relatos de assédio moral se somaram aos de assédio sexual publicados aqui dois dias antes, em reportagem que levou à queda de Guimarães.

Agora, a coluna teve acesso a novos áudios de uma reunião realizada no final do ano passado na qual o então presidente da Caixa esbravejou contra uma decisão que, na prática, o faria perder mais de R$ 100 mil reais por mês.

A mudança no regimento interno, que tinha acabado de ser aprovada, estabelecia um limite à participação do próprio Pedro Guimarães e de outros executivos em conselhos de subsidiárias da Caixa e de empresas privadas das quais o banco é sócio.

Ele se irritou porque seus subordinados diretos não atentaram para os reflexos da decisão antes de ela ser aprovada.

Como já publicamos aqui, Guimarães chegou a integrar pelo menos 18 conselhos, os quais lhe renderam mais de R$ 130 mil em jetons — uma espécie de gratificação pelo trabalho extra.

O valor era acrescentado ao salário de R$ 56 mil que ele recebia como presidente do banco estatal. Na soma de salário com jetons, os rendimentos de Guimarães giravam em torno de R$ 200 mil mensais.

A certa altura da reunião, o então presidente da Caixa diz: “P* que pariu, isso é tão ridículo, cara… Me mato de trabalhar que nem um filho da p* do c* elevado à décima quinta para nego só me f*”.

A seguir, os principais trechos.

“Me mato de trabalhar para nego só me f*”
Após cobrar os subordinados, Pedro Guimarães reclama porque a decisão o faria perder dinheiro. Prevendo que a situação um dia poderia se tornar pública e deixá-lo exposto, ele ordena ao então vice-presidente Celso Leonardo Barbosa, de quem é amigo pessoal, que fizesse os cálculos para efetuar a devolução dos valores que, até ali, havia recebido em desacordo com a nova regra.

Guimarães também manda sua chefe de gabinete, Rozana Alves, acionar a Corregedoria da Caixa para punir os participantes da reunião caso o teor da discussão vazasse. E, sem meias palavras, ameaça os participantes de demissão.

Celso Leonardo Barbosa e Rozana Alves foram afastados dos cargos que ocupavam após a saída de Pedro Guimarães da Caixa.

Disse Guimarães, irritado:

“Isso vai vazar, para me desgastar. Isso é para me desgastar. P* que pariu, eu vou devolver o dinheiro. Faz a conta, entendeu, Celso? Tem que fazer a conta, e tem que fazer a conta que doa mais no meu bolso. Ou seja: assumir os CAs (conselhos de administração) que eu ganho menos. Puta que pariu, isso é tão ridículo, cara… Me mato de trabalhar que nem um filho da p* do c* elevado à décima quinta para nego só me f*.”

“Não tem essa de querer ficar comigo e com o Lula”
Para Pedro Guimarães, os subordinados que deixaram passar a mudança que o prejudicava estariam fazendo gestos para a oposição, já pensando em uma possível vitória de Lula nas eleições de outubro. Mais uma vez, ele faz ameaças. Dirigindo-se a Celso Leonardo, diz: “Faça uma reunião amanhã com todo mundo e, p*, entende essa maluquice maluca de grau 27. De novo, é o que já falei”.

“Vreco (apelido de Álvaro Pires, outro amigo pessoal que Guimarães levou para a Caixa como assessor especial do gabinete da presidência, com salário de R$ 30 mil), você aja, e eu também. Eu já falei com você ontem, e com o Celso. Estão querendo me f*. Eu não acredito que isso daí é incompetência. Eu acredito no que eu já falei para vocês dois: está chegando a eleição e nego está querendo fazer hedge (se proteger), e eu vou tirar todo mundo que eu achar que está fazendo hedge. Porque, deixa eu falar para todos vocês (dirigindo-se aos demais subordinados): ou vocês estão comigo ou vão buscar Haddad e o Lula. Não tem essa de querer ficar comigo e com o Lula. Bem claro isso. Porque isso eu não acho que é um erro. Nego não pode ser tão ruim assim, a ponto de querer me expor dessa maneira. E ninguém viu?”, prossegue.

“Ô, Celso veja isso no detalhe. Eu vou devolver o dinheiro, não tem condição. Como é que eu não vou devolver o dinheiro? Vai estourar essa merda daqui a seis meses, dizer que estou roubando a Caixa. Eu não estou, eu não sei, eu era contra, nunca ninguém falou isso para mim. O Mauro (Mauro Cunha, ex-presidente do Conselho de Administração da Caixa) nunca nem chegou a comentar isso comigo, porque ele sabia que era inaceitável. Então, isso é traição. Porque isso passou sem nunca ninguém passar para mim. Agora, Rozana, Celso e Vreco, vai ter que ler tudo o que foi feito nos últimos três anos porque nego está me f*, nego vai me f*. Como é que eu vou saber? Como é que eu vou ter tempo, eu não posso confiar nas pessoas de dentro do banco? Porque isso para mim é falta de lealdade. É querer, p*, fazer hedge para se o presidente (Jair Bolsonaro) não ganhar (a eleição). Só que eu vou tirar. Ô, Celso, você olha isso no detalhe?”, diz ainda.

Celso Leonardo responde afirmativamente: “No detalhe”. E Guimarães continua. “E eu já te digo: isso é ‘filhadaputagem’. Eu não acredito em erro aí. Eu acredito que tem nego querendo me f*.” Celso concorda: “Mas é claro, claro que tem coisa aqui, pô”.

Uma mudança fora dos planos
Em outro trecho, também misturando lamento e raiva, Guimarães afirma que a limitação no número de conselhos é um “absurdo total”.

Diz ele: “O que que acontece, né? Tudo vaza. E isso é um absurdo total. Absurdo máximo, e um erro. Porque nunca eu cogitei aceitar ficar só restrito a dois conselhos, isso nunca foi trazido a mim nem pelo Mauro. Então, teve um erro aí, que não sei se foi de má-fé ou porque as pessoas não fizeram o dever de casa. Porque nunca esteve sob discussão… Imagina, quer dizer que eu só poderia estar na Caixa? E aí vou estar na Caixapar, na Caixa Seguridade, na Caixa Asset, na Caixa Cartões, e não vou estar nas cagadas e não vou estar nas subsidiárias? Não existe”.

“Como a gente vai resolver isso?”
Pedro Guimarães diz que a mudança nas normas internas foram aprovadas para prejudicá-lo, e admite que assinou a decisão sem ler.

“Foi feita uma mudança que não era para ter sido feita. Isso para mim é óbvio. Porque se a gente chegar e assumir que, durante seis meses, era para eu ter estado só em dois conselhos, como a gente vai resolver isso? Se eu nunca fui avisado disso… Ah, mas aí eu assinei uma coisa que eu tinha que saber. Como é que sai dessa sinuca de bico?”, afirma o então presidente da Caixa.

“Isso, para mim, é traição”
Em outro momento da reunião, Guimarães afirma que estava se sentindo traído pelos subordinados, que não o alertaram sobre a mudança, nem fizeram nada para evitar que ela fosse aprovada.

Ele pede a Rozana Alves, sua chefe de gabinete, que anote os CPFs de todos os executivos da Caixa que tiveram conhecimento da proposta antes de ela ser aprovada. E afirma que devolveria o valor dos jetons recebidos após a mudança na regra para não ouvir que ganhou “dinheiro em cima do banco”.

“Todas as pessoas que leram isso vão explicar por que aprovaram isso. Porque isso aí não existe. Se não, fico eu sozinho, e o pessoal falando que eu quero ganhar dinheiro em cima do banco. Então, assim… Eu quero avaliação do Gryecos (Gryecos Loureiro, diretor jurídico da Caixa). Eu vou devolver, claro que vou devolver. Já que eu vou ficar um ou dois meses ganhando mais, eu vou devolver, R$ 100, R$ 200 mil reais… É a vida como ela é. Não tem a menor possibilidade de eu tomar esse risco, não vou tomar esse risco. Está me custando dinheiro. É a vida como ela é. Incompetência. Ou quererem me f*. A cada dia que passa, eu acho que nego quer me f*. Eu vou perdendo confiança. É muita coisa acontecendo ao mesmo tempo agora que está próximo da eleição, que o PT parece que está crescendo e nego, na minha opinião, querendo fazer hedge. Só que isso, para mim, é traição. Então, isso daí… Eu não consigo entender uma incompetência tão grande. Eu não consigo entender ter passado (no Conselho de Administração da Caixa) que para todas as pessoas só valem dois conselhos, quando todo mundo no banco sabe que eu (inaudível). P*, a Caixa Seguridade era capital aberto. A Caixa Econômica Federal, isso aí, o CD (Conselho Diretor) é um conselho também, ou não?”.

Ele devolveu o dinheiro, afinal?
A coluna procurou Pedro Guimarães por meio de seu advogado, José Luis de Oliveira Lima, para ouvi-lo sobre o teor da reunião.

Oliveira Lima respondeu o seguinte, por escrito: “Pedro Guimarães não extrapolou em nenhum momento os limites legais e estatutários no que se refere à participação em conselhos de administração. Até novembro de 2021, a Caixa aplicava vedação prevista na Lei das Estatais (Lei 13.303/2016) apenas à participação remunerada em até dois conselhos de empresas públicas, sociedade de economia mista e suas subsidiárias. Tal vedação não incluía empresas privadas”.

A nota prossegue: “Em novembro de 2021, o Estatuto Social da Caixa foi alterado, passando a incluir o limite de participação remunerada a dois conselhos, independentemente da natureza pública ou privada. A partir de então, Pedro Guimarães restringiu sua presença remunerada em conselhos ao novo critério estabelecido no estatuto”.

Perguntamos se Guimarães devolveu à Caixa os valores que, na gravação, ele diz que teria que ressarcir. O advogado respondeu que não havia o que devolver porque o ex-presidente da Caixa cumpriu o que estava previsto no estatuto. “Ele não tinha que devolver nada, pois tudo estava dentro da lei”, diz Oliveira Lima.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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